Compras online e Remessa Conforme

Compras online e Remessa Conforme

Finanças Opinião

Antes de tudo, este é um artigo de opinião, a ideia é somente expor uma visão, um ponto de vista sobre o tema do momento que são as compras online e o novo programa do Governo, o Remessa Conforme.

Eu, particularmente, já tive um e-commerce há alguns anos, motivo pelo qual ainda me interesso e acompanho o assunto de perto, ao menos foi dessa forma que cheguei ao assunto que trago hoje nesta matéria.

O que é o programa?

Não vou cobrir o assunto tecnicamente, mas o programa Remessa Conforme consiste basicamente em um cadastro do lado das empresas que desejam exportar seus produtos para o Brasil e determina uma nova forma de tributação.

Basicamente, fica a cargo das empresas recolher os impostos e repassar o valor para o governo brasileiro sobre qualquer item comercializado. Antes, os impostos só seriam recolhidos se o produto fosse retido na alfândega, por exemplo.

As taxas? Nas compras de até 50 dólares, o único imposto será o ICMS, que varia entre os estados (o mínimo até o momento é de 17%). Já as compras acima desse valor, além do ICMS, entra também uma taxa de importação de 60%, sobre o valor do produto.

Em sua maioria, o programa se destina aos famosos sites chineses que comercializam de tudo um pouco, mas outras gigantes do setor como Amazon e Mercado Livre já aderiram ao programa.

O que o Governo diz que resolve?

Ao longo de 2023 houveram inúmeras explicações, idas e vindas sobre o assunto, decisões que tomaram proporções impopulares (internet “caiu matando”) e desistências (ctrl+z, ctrl+z, ctrl+z) e, por um bom tempo, ficamos nesse morde e assopra.

Mas com o programa, o governo listou alguns pontos de melhora, que foram dignos (contém ironia): proteger o cidadão, facilitar o despacho aduaneiro e garantir a entrega dos produtos, aumentar a fiscalização, proteger a indústria nacional (eu chamo de lobby) e até combater o vício das compras online, “ajudando” a população a gastar menos.

O que - de fato - resolve?

Curto e grosso? A vida do Governo!

Há uma enorme dificuldade por parte do Governo para lidar com o volume de encomendas que circulam pelos portos brasileiros diariamente. Não há "braço" - por assim dizer - para receber, processar, taxar e despachar quase 20 mil encomendas por hora.

A solução mágica do Governo? Transferir todo o trabalho e responsabilidade para as empresas de: calcular, cobrar e repassar o novo imposto para o Governo, em troca (em teoria), cria um corredor especial, uma passagem facilitada pelo nosso processo aduaneiro.

Em uma única manobra do Governo ele passa a taxar todas as compras automaticamente, estejam acima ou abaixo 50 dólares, eliminando o fator “sorte” que havia devido a própria ineficiência. Tudo isso sem investir um centavo em modernização, ampliação da capacidade dos portos, fiscalização e etc.

Ou seja, para o Governo a expectativa é um aumento na arrecadação e para nós, um mínimo de aproximados 92% de imposto nas compras acima de 50 dólares (por enquanto), uma nova modalidade de promoção no estilo BRlandia, é o “pague 2 e leve 1”.

O que ninguém percebeu ainda?

Que esse tipo de decisão (regra) simples, monocrática, sem base técnica ou algum estudo mais aprofundado, aplicada a um sistema complexo tem pouco ou nenhum efeito, de fato, no longo prazo.

Primeiro, havia todo um ecossistema estável de negócios que, certamente, se vê forçado a buscar alternativas para continuar comercializando seus produtos. Ambos os lados (vendedores e compradores) têm interesse em driblar essa taxação e, cedo ou tarde, vão encontrar algum método para fazê-lo. Usando uma analogia simples, seria algo como jogar uma pedra num lago, por algum tempo haverá alguma turbulência, mas logo a água volta ao seu estado natural.

Segundo, ignoram também o básico da oferta e demanda, esta sim com influência direta nos preços e na forma como as pessoas fazem negócio, compram seus produtos, etc.

Um exemplo:

Uma loja no Brasil (loja A) possui 100 unidades de um produto e os vende em média a R$100 a unidade. A loja internacional (loja B) vende o mesmo produto por R$50, porém os entrega em média 1 mês após a compra.

Com o modelo de tributação exigido no novo programa, ambas são obrigadas a vender o mesmo produto a R$100. A loja A que está com a vantagem da localização e por não existir mais a vantagem do preço, vende mais e entrega os produtos mais rapidamente, esvaziando todo o seu estoque em 2 meses. No mesmo período, a loja B vendeu somente 10 unidades do mesmo produto.

Agora, a loja A precisa importar novamente, porém devido ao sucesso de vendas, deseja importar 2, 3, 10 vezes mais produtos, e do outro lado, a loja B precisa vender o estoque o quanto antes e fazer algum dinheiro.

Por conta do pedido maior da loja A, a fabricante dos produtos se vê obrigada a empregar mais funcionários, comprar mais matéria prima, etc., para atender a nova demanda e elevar o preço do produto em R$10.

Não estou sendo sequer criativo aqui, estou falando somente de pessoal e matéria base para produzir os produtos.

Em paralelo a loja B inicia uma grande promoção e baixa o preço para R$80, já considerando o novo cenário, impostos e etc., para diminuir o dinheiro parado em estoque.

Com isso, temos uma diferença de R$30 de uma loja para a outra. Repita esse processo algumas vezes, ou adicione alguma complexidade, como câmbio, novos fabricantes, mais lojas no Brasil aproveitando o "boom" de vendas, escassez de matéria prima, sanções, guerra e por aí vai, pra que eu pouco tempo voltemos ao cenário inicial, onde comprar de varejistas nacionais sai mais caro do que dos marketplaces chineses.

Veja que explorei basicamente a diferença no tempo de entrega, mas imagine o cenário onde a loja A certa de que você não consegue comprar o produto de outra forma, decide elevar o preço do produto em 10, 20, 100%?

Enfim, antes do Remessa Conforme, comprar um produto no Ali Express, por exemplo, era algo similar a um jogo de azar. Ele podia chegar ou não, ele podia ser taxado ou não e, neste último, ainda existia a possibilidade de avaliar se realmente valia a pena pagar todas as taxas (impostos) e receber seu produto.

Agora, sem melhorar nada - de fato - e supondo que o Governo não irá mudar as regras novamente, podemos comprar 2 produtos e levar 1, para proteger a indústria nacional ou qualquer que seja a desculpa, é o bom e velho “vai que cola”.

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